sexta-feira, 30 de abril de 2010

Corbijn e Dreyer


Há várias sequências prodigiosas no filme "Control" de Anton Corbijn. Uma delas é no momento em que Ian Curtis inicia a sessão de hipnose com a ajuda do amigo e músico Bernard Summer. Curtis está sentado num sofá preto, e a câmara começa a circular à volta do cantor dos Joy Division. Pela profundidade emocional do momento, pelo preto e branco imaculado da fotografia, fez-me de imediato pensar numa sequência similar do filme "A Palavra" de Carl Dreyer (na foto): o personagem que se julga Cristo está sentado no meio da sala a falar com a sobrinha, e a há um movimento de câmara que gira em volta da sua figura, lentamente. Percebo porque é que alguns críticos referiram Dreyer como influência para certas imagens de "Control". Depois, o final do filme, com a câmara a subir pela chaminé crematória até se fixar no respectivo fumo negro, com a música "Atmosphere" em fundo, é um espantoso exercício de mise-en-scène. E um dos mais belos e comoventes finais de filme dos últimos anos (na sala de cinema onde assisti ao filme de Corbijn havia uma rapariga à minha frente a chorar copiosamente).

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Nada mais simples

"O segredo da criatividade é saber como esconder as fontes."
Albert Einstein

Jodorowsky - Um cineasta de culto


É um dos grandes cineastas malditos e de culto da história do cinema da segunda metade do século XX - Alejandro Jodorowsky (nasceu em 1929). E, apesar de ter feito apenas sete filmes ao longo da sua carreira única, bastaria um só filme para atestar esta premissa: "The Holy Mountain" (1973). Um cineasta com uma visão extremamente original da arte e do cinema, um esteta da imagem, um místico surrealista.
Nascido no Chile, Jodorowsky mudou-se nos anos 50 para Paris onde viveu e conheceu os escritores Fernando Arrabal e Roland Topor, com quem fundou o mítico grupo teatral "Movimento Pânico" (fundia humor e terror). É também conhecido como escritor, dramaturgo e autor de banda desenhada (ou novelas gráficas).
Há um dado curioso em relação ao filme "The Holy Mountain": o cineasta chileno foi financiado inteiramente por John Lennon e Yoko Ono para fazer realizar o filme, visto que estes ficaram impressionados com o seu filme anterior, "El Topo" (1970). "The Holy Mountain" é um filme iconoclasta, repleto de misticismo e simbolismo, e situações completamente inusitadas. Provocador face à religião e seus rituais, Jodorowsky subverte e corrompe quaisquer referências religiosas e sexuais com uma linguagem visual irreverente e um sentido de humor absurdo. Conta-se que, para fazer este singular filme, o realizador esteve vários dias sem dormir ao lado de um mestre Zen.
Influenciado pelo imaginário estético mais bizarro de um Fellini e pelo surrealismo de um Luís Buñuel, Alejandro Jodorowsky - que chegou a estudar mímica com Marcel Marceau - tornou-se num cineasta de culto reverenciado por nomes como David Lynch, David Cronenberg ou George Romero. Vendo os seus filmes percebe-se porquê.


quarta-feira, 28 de abril de 2010

30 anos sem o mestre


29 de Abril de 1980: há 30 anos morria o mestre Hitch.

Polaroids de Tarkovski


Andrei Tarkovski, para além de ter sido um genial cineasta, foi um excelente escritor, pensador(basta ler o seu único livro "Esculpir o Tempo") e um fotógrafo talentoso. O realizador russo fotografou sempre ao longo da vida, especialmente nos momentos em que fazia pesquisa para os seus filmes. Há uns tempos foi editado um livro com fotografias (polaroids) do autor de "Stalker", acompanhadas de poemas do seu pai, Arseni Tarkovski e prefácio do filho, Andrei Tarkovski Jr.
O livro tem o belo título de “Bright, Bright Day” e é uma edição conjunta da Galeria White Space e da Fundação Tarkovski de Florença. Tarkovski era um aficionado amador da fotografia, gostava dela como antecâmara das imagens em movimento que tão bem conseguiu explorar no grande ecrã. O cineasta fotografava actores, familiares (mãe, filho), cenários de filmes, paisagens para estudar enquadramentos de câmara, a realidade do dia-a-dia do seu exílio forçado em Itália e na Suécia. Certamente que será um documento precioso para compreender melhor toda a complexidade artística e visual de um dos criadores mais fascinantes e místicos da Sétima Arte. Um livro que um dia hei-de adquirir.
Para ler mais informação e encomendar o livro (tem o preço pouco simpático de 30£) é favor abrir o link. Para mais informação sobre esta edição, aqui.

Tema relacionado - "A Luz Instantânea de Tarkovski"

segunda-feira, 26 de abril de 2010

"Born Free" - o videoclip polémico


É a bomba do momento. Mais em baixo colocava um vídeo provisório da nova música da M.I.A., mas só hoje é que fiquei a conhecer o videoclip oficial realizado pelo polémico realizador Romain Gavras, filho do cineasta político Costa-Gavras. O videoclip "Born Free" é uma curta-metragem de 9 minutos de pura adrenalina visual e violência explícita (já censurada no YouTube).
Num mundo aparentemente utópico, militares (polícia? forças especiais?) com a bandeira dos Estados Unidos estampada no uniforme, caçam e abatem grupos de jovens ruivos com uma violência gráfica inusual na estética do videoclip. Se o jovem Romain Gavras já tinha causado polémica com o vídeoclip "Stress" que fez para Justice, então deve preparar-se para polémica a dobrar com este impressionante trabalho, numa espécie de metáfora sobre conflitos étnicos de diversas regiões pelo mundo.
Chamo a particular atenção para os fantásticos últimos 3 minutos do videoclip, em que sons e imagens se conjugam para um final em imparável crescendo de intensidade. Brutal.
Para ver em ecrã inteiro e com boa resolução, clicar aqui.

A inovação "Book"

Numa altura em que, paradoxalmente, há cada vez mais livros editados mas menos leitores (sobretudo jovens), importa ter em atenção esta excelente campanha espanhola de incentivo à leitura. Pegando na lógica da apresentação de produtos tecnologicamente inovadores (qual i-Pad ou outro gadget electrónico), esta campanha utiliza uma linguagem aparentemente tecnológica que desconcerta pela simplicidade e eficiência da mensagem e da comunicação. Uma abordagem deveras original ao mundo do livro.
O número de Maio da BLITZ traz na capa Joy Division, a mais importante banda de sempre do pós-punk. E a minha banda preferida de toda a história do rock. Nem podia ser de outra forma: em Maio celebram-se 30 anos da morte de Ian Curtis. "This is the way, step inside!"

domingo, 25 de abril de 2010

Canções rock "extra-large"

Qual a duração que uma música pop/rock deve ter? Certamente que não existe um resposta definitiva. Nos primórdios do rock, com Elvis Presley ou os Beatles, por exemplo, uma canção não ultrapassava, em média, os três minutos. Era o tempo formatado para puderem passar nas rádios (comercialmente falando, ainda é o tempo de canção mais viável). O mesmo com as canções que emergiram do movimento punk: rápidas, incisivas e concebidas em dois ou três simples acordes de guitarra.
Mas houve outras épocas e outros géneros musicais em que o formato convencional de canção foi subvertido através da exploração de temas de duração alargada. É o caso do rock progressivo e psicadélico, fértil na criação de músicas com 10 minutos ou mais de duração, com improvisações sinfónicas, rendilhados estilísticos, e estruturas instrumentais complexas.
Neste contexto, vale a pena espreitar a lista das dez canções rock com mais de 10 minutos de duração. Jimi Hendrix, Led Zeppelin, Deep Purple, King Crimson, Television, Pink Floyd e, até, Bob Dylan, exploraram canções com mais de 10 minutos de duração. Algumas beneficiam com a duração, outras, claramente, ficam prejudicadas (quando a criatividade e a substância escasseiam).

O regresso de M.I.A.

Descobri este vídeo através da página do Facebook do Vítor Belanciano: um novo e poderoso tema de M.I.A. que fará parte do novo disco desta artista. "Born Free", nem de propósito oportuno para este dia 25 de Abril, é construído com base num sample do fantástico tema "Ghost Rider" dos Suicide, e tem um dos mais inebriantes inícios de música dos últimos tempos. É escutar, é escutar...

Dia da Revolução

Well look out

Well I’m sick
I’m so sick
Of a lot of people
Tryin’ to tell me
What I can and can’t do
With my life


And I’m tired
I’m so tired
Of a lot of people
In a lot of high places
Don’t want you and me
To enjoy ourselves
Well I’m through with people
Who can’t get off their arse

To help themselves change this government
And better this society‘
Cos it’s shit
But hold on a second
I smell burning
And I see a change

Comin’ ‘round the bend
And I suggest to you
That it takes
Just five seconds
Just five seconds
Of decision

To realise
That the time
Is right
To start thinkin’ about
A little…Revolution!

sábado, 24 de abril de 2010

A vida real e a ficção


No magistral filme “Annie Hall” (1977) de Woody Allen, há uma cena desconcertante: o personagem interpretado por Woody Allen está numa fila de uma bilheteira de cinema; encontra um casal amigo e começam a falar, naqueles discursos intelectuais sobre arte e cultura, muito ao gosto do realizador.
O homem divaga sobre a teoria de Marshall McLuhan (o mesmo que lançou o conhecido conceito de “Aldeia Global”) e o personagem de Woody Allen, farto de ouvir tantas baboseiras redundantes e pseudo-académicas, replica sarcasticamente: “Desculpe, mas o senhor é um pedante e não percebe nada do verdadeiro pensamento de McLuhan”, ao que o homem responde: “Sim? E como tem essa certeza?”. Woody Allen sai da fila da bilheteira e vai buscar pelo braço o próprio e verdadeiro Marshall McLuhan (que se encontrava escondido atrás de um cartaz!) que diz ao pretenso intelectual: “É verdade, o senhor não percebe nada da minha teoria!”. Então, Woody Allen olha para a câmara (para nós, espectadores) e remata de forma seca e resignada: “Se a vida fosse assim tão fácil!…”.
Um belo exemplo de como a ficção e a realidade se entrelaçam num filme. A verdade é que no maravilhoso mundo do cinema as duas dimensões podem, deliberadamente, confundir-se (aquilo que é a realidade ficcionanda e a "realidade quotidiana"). Atente-se a mais estes dois notáveis filmes sobre esta temática da fusão ou dualidade entre o mundo real e o ficcional: “A Rosa Púrpura do Cairo” (1985), também de Woody Allen (na imagem), em que um actor de um filme que é exibido numa sala de cinema sai, literalmente, do ecrã para se apaixonar por uma rapariga da “vida real”; "Zelig", fascinante exercício de falso documentário de Woody Allen, comentado por mim neste post.
E “The Truman Show” (1998), de Peter Weir, admirável exercício de manipulação da realidade com base num programa demencial de “reality show”, no qual o actor Jim Carrey julga viver a realidade quando, na verdade, esta não passa de uma grotesca encenação televisiva totalmente ficcionada.
Contudo, um dos maiores mestres na manipulação da realidade e da “verdade” do real foi o realizador espanhol Luís Buñuel. Visionário e provocador como poucos, este surrealista amigo de Salvador Dalí serviu-se dos postulados da teoria psicanalítica e da corrente literária do surrealismo com o intuito de subverter os nossos cânones mentais de entendimento da “realidade”. O sonho comanda a vida, e esta pode transformar-se numa ficção real ou numa realidade ficcionada. Muitas das suas obras revelam esse prodigioso poder que o subconsciente pode exercer sobre a vivência humana do real, quotidiana e mundana. E com isso deslumbra pela sua originalidade da visão do mundo, pela recriação da vida segundo a lógica não racionalista, renovando os "mecanismos de imaginação" do espectador.

Dois filmes num só








sexta-feira, 23 de abril de 2010

O gangster Tony Montana


E por falar em Sam Peckinpah, no dia 9 de Dezembro de 1983, há precisamente 25 anos, estreava um dos filmes paradigmáticos dos anos 80 e um dos que mais polémica levantou por causa do uso excessivo da violência na esteira de Peckinpah: "Scarface", de Brian de Palma (uma espécie de remake livre do clássico filme de gangsters de 1932 realizado por Howard Hawks).
Com argumento ousado de um jovem chamado Oliver StoneAdicionar imagem, um alucinante Al Pacino no papel do implacável gangster sem escrúpulos Tony Montana, e com uma estreante e bela Michelle Pfeiffer, "Scarface" tornou-se num fascinante objecto de culto durante muitos anos. Um marco que influenciaria dezenas de outros filmes similares.
Lembro-me de o ver "Scarface" no cinema, por volta de 87 ou 88, e de ter ficado siderado com tão marcante interpretação de Pacino e com a história carregada de adrenalina à volta de traficantes de droga e corrupção em Miami. E mais fascinado fiquei ao ver os últimos 10 minutos de película, nos quais o irascível Tony Montana, submerso em drogas e alucinações derivadas de traições familiares (reminiscências da saga "O Padrinho"), reage violentamente ao assalto à sua mansão na qual tem uma estátua com a irónica inscrição - "The World is Yours". Uma impressionante sequência de tiroteio que o realizador que estilizou a violência gráfica, Sam Peckinpah, não desdenharia.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Um novo olhar sobre Portugal


Hoje tem início o festival IndieLisboa. E, pelas primeira vez na sua história, as honras de abertura cabem a um filme português: “Fantasia Lusitana” de João Canijo.
Um filme que, segundo a opinião do crítico Jorge Mourinha, expressa aqui, permite reavaliar os fantasmas do passado graças a um material de arquivo inédito, num mergulho perturbador no obscurantismo que dominou Portugal durante 48 penosos anos.
Há dias escrevia que faltam filmes portugueses que abordem o Estado Novo e a ditadura fascista. Faltam novos olhares, novas abordagens, de forma a exorcizar, cada vez mais fundo, as raízes do salazarismo e suas consequências no Portugal de hoje.
Daí que seja interessante ler a esclarecedora entrevista feita a João Canijo, concedida ao jornal i. Uma entrevista reveladora que prova que Portugal foi, durante cinco longas décadas, um país à deriva, inerte, atrasado e alienado que promovia uma falsa noção de prosperidade e nacionalismo bacoco.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sam Peckinpah e a espiral da violência


O tema da violência no cinema é um tema recorrente e polémico desde as primeiras experiências com imagens em movimento. Há estudos académicos e livros teóricos que abordam ao detalhe a relação entre a violência e a imagem.
1971 foi um ano particularmente fértil na produção de filmes sobre a violência: “Dirty Harry” de Don Siegel (com o implacável polícia interpretado por Clint Eastwood), “A Laranja Mecânica” de Stanley Kubrick e “Straw Dogs – Cães de Palha” do mestre (maldito) Sam Peckinpah.
Os dois últimos filmes foram banidos e censurados ao longo de décadas, inclusive, em países ditos liberais como a Inglaterra e os EUA pela sua violência explícita e estilizada. “Cães de Palha” é um impressionante manifesto sobre a violência, sem moralismos facciosos. É a história de um homem comum, um professor de matemática interpretado por um perturbante Dustin Hoffman, vai viver para o campo com a sua mulher no intuito de encontrar sossego para o seu trabalho. Acontece que, a partir de dado momento, os habitantes da aldeia invadem o território do casal e inicia-se uma incrível espiral de violência gráfica e realista (como a sequência da violação, à data altamente polémica e ousada). É também um filme sobre como um cidadão comum reage sob extrema pressão psicológica face a situações de brutal e crescente adversidade. Um estudo sobre o lado mais animalesco da mente humana.
Sam Peckinpah, decididamente, foi o cineasta que mais influenciou realizadores como Quentin Tarantino ou Robert Rodriguez, não só com este filme, mas também com aquele que realizou dois anos antes: o fabuloso "The Wild Bunch" ("A Quadrilha Selvagem"), o western em espiral de ultra-violência que "acabou com a mitologia nobre da tradição do western", nas palavras de John Wayne.

A fé de Sam Harris na ciência


O Vaticano está a passar um mau bocado devido aos escândalos da pedofilia. E os EUA estão a viver um período complexo no que concerne à educação e ao paradigma de valores que incutem nas novas gerações. É que, por incrível que pareça, em pleno Século XXI, há muitos milhões de americanos que acreditam na corrente criacionista da vida, isto é, uma corrente que interpreta à letra os postulados da Bíblia. Significa isto que os defensores do criacionismo defendem a ideia de que o homem descende de Adão e Eva, que conviveu com os dinossauros e que o Dilúvio existiu mesmo, entre outros tantos delírios romanceados.
Na prática, os defensores desta corrente religiosa refutam todas as evoluções científicas e teóricas conseguidas pelo homem durante o século XIX e XX, como a teoria da Evolução das Espécies de Charles Darwin e todas as conquistas técnicas e tecnológicas. Em contraposição, o Evolucionismo é uma teoria científica fundamentada em achados fósseis concretos ou em experiências bio-genéticas realizadas, enquanto que o Criacionismo é abstracto, indemonstrável e desprovido de quaisquer bases científicas.
E o que tem este livro, “O Fim da Fé”, a ver com tudo isto? Tem tudo a ver porque ataca toda a religião conotada com o Criacionismo, e todo o tipo de manifestação religiosa, como causas dos males do mundo. Na verdade, Sam Harris, mais do que Richard Dawkins ou Christopher Hitchens, escreveu um dos mais violentos ataques contra os paradigmas religiosos, sejam de tendências extremistas ou moderadas. Defende que a razão e a ciência são as únicas estruturas basilares que sustentam a evolução da humanidade e que o terrorismo se baseia na má interpretação da fé. “O Fim da Fé” (lançado pela Tinta da China), reclama o direito do homem a ser um pensador livre, sem amarras de dogmas infundados definidos em escrituras milenares e aponta a fé como a mais infame e fantasiosa forma de entender a vida humana, o mundo e qualquer fenómeno natural. Sam Harris leva o seu ateísmo militante às últimas consequências, em defesa da razão e contra o fundamentalismo dogmático de qualquer religião ou de fantasias pseudo-religiosas.
Site oficial de Sam Harris.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Perguntas indiscretas - 28

A Selecção Nacional de Futebol adoptou um hino para a sua campanha no próximo Mundial da África do Sul: "I've Got a Feeling" dos Black Eyed Peas. Agora vem a pergunta difícil: à semelhança da música que pretende representar o espírito da Selecção, se houvesse necessidade de escolher um filme que se identificasse, de igual modo, com os jogadores portugueses, qual seria esse filme?

Pedro Costa em Madrid


Pedro Costa, apesar de todo o reconhecimento crítico internacional (basta ver a recente edição em DVD dos seus últimos filmes por parte da prestigiada editora Criterion), nunca tinha estreado comercialmente um filme em Espanha. Fê-lo agora com "Ne Change Rien".
O jornal El País aproveitou a passagem de Pedro Costa por Madrid para lhe fazer uma entrevista, a qual pode ser lida e vista (em vídeo, um excerto) aqui. Para além de explicações sobre o seu método de trabalho e da sua visão do cinema, o cineasta português aborda um tema que raramente explicita nas entrevistas que dá: a relação da música com o cinema, ou por outra, como o documentário musical deve tratar a música sem cair nos clichés habituais. Sobre este assunto, Costa frisou algumas ideias interessantes, como a de que "Ozu ter muito dos discos de The Wire ou Sex Pistols" (!).

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Discos que mudam uma vida - 103


Violent Femmes - "Violent Femmes" (1983)
O primeiro disco de vinil que comprei (por volta de 1986). Foi num tempo em que se compravam discos via postal, encomendando por catálogo e recebendo em casa uns dias (ou semanas depois). A emoção de colocar a agulha na rodela de vinil pela primeira vez gravou-se para sempre na minha memória. Claro que canções pujantes como "Add it Up", "To the Kill", "Gone Baby Gone" ou "Kiss Off" ajudaram a esse processo de gravação. Na altura quase ninguém conhecia Violent Femmes, e só passava nos programas de rádio mais alternativos, como o saudoso "Som da Frente" de António Sérgio.
O outro dia ouvi um tema deste disco num... supermercado, a servir de tapete sonoro enquanto os clientes compravam cenouras ou cereais. O mundo mudou mesmo...
Ainda assim, continua uma obra musical memorável.

Quando Hitchcock viu um espectáculo assustador

O mestre do suspense e dos filmes de terror psicológico assistiu uma vez à cena mais assustadora. Não foi no domínio da ficção, mas no mundo real.
Trata-se de um episódio revelado no livro "A Desilusão de Deus" de Richard Dawkins e conta-se desta maneira simples: o realizador Alfred Hitchcock ia certa vez de viagem pela Suíça quando de repente apontou pela janela do carro em que seguia e disse: "Eis o espectáculo mais assustador a que alguma vez assisti." Era um padre a conversar com um rapazinho, com a mão sobre o ombro deste. Hitchcock pôs a cabeça de fora da janela do carro e gritou: "Foge, miúdo! Foge ou estás perdido!"

domingo, 18 de abril de 2010

O cinema de animação dos irmãos Quay

No cinema existem os irmãos Coen e os irmãos Quay. Os primeiros são sobejamente conhecidos e reconhecidos. Já os segundos, os Quay, irmãos americanos e gémeos verdadeiros, gozam de muito menos popularidade, mas possuem altíssimo reconhecimento artístico dentro da área em que se movimentam. Fazem cinema de animação, misturando múltiplas técnicas de animação (sobretudo bonecos, marionetas, objectos). O seu cinema é visualmente apelativo, com elaborados jogos de luz e de sombras, ambientes surrealistas e densos, preocupação pelos detalhes estéticos, movimentos de câmara invulgares num universo negro e expressionista.
Tim Burton afirma que o imaginário dos Quay exerceu grande influência no seu cinema. E nota-se. Foram os irmãos Quay que conceberam um dos mais notáveis videoclips da história da música pop - "Sledgehammer" de Peter Gabriel. Por outro lado, Terry Gilliam, dos Monty Python, elege os irmãos Quay como os mais criativos realizadores de animação dos últimos 30 anos. Vale bem a pena descobri-los.

Os meus "Guilty Pleasures" cinéfilos

O blogue Cinema JB dinamiza uma interessante iniciativa intitulada "Guilty Pleasures - os Jardins Proibidos de um Cinéfilo". "Guilty pleasures" cinéfilos são aqueles prazeres recônditos e que raramente se divulgam nas listas dos filmes preferidos. Filmes considerados menores, "blockbusters", série Z, "popcorn movies", entre outras derivações do género. Porém, fazem parte da formação do gosto cinematográfico que se revêem sempre com prazer inconfessável.
O blogue Cinema JB convidou-me a revelar os meus 5 "Guilty Pleasures" do cinema. Quem os quiser conhecer, basta clicar aqui.

sábado, 17 de abril de 2010

Olhos & olhares

"Psycho" (1960) - Alfred Hitchcock
"Whirlpool" (1949) - Otto Preminger
"The Fury" (1978) - Brian De Palma
"Repulsion" (1965) - Roman Polanski
"Reflections in a Golden Eye" (1967) - John Huston
"Not of This Earth" (1957) - Roger Corman

"Love is Colder Than Death" (1969) - R. W. Fassbinder

"Father of The Bride" (1950) - Vincente Minnelli
"The Elephant Man" (1980) - David Lynch
"Badlands" (1973) - Terrence Malick

Tanto para fazer antes de morrer



As edições livreiras têm inundado o mercado com livros (melhor: manuais quase bíblicos) sobre o que devemos ouvir, ler, ver, comer, beber e conhecer antes de morrer. E os editores não fazem a coisa por menos - são sempre 1001 títulos para conhecer, nunca 100 essenciais ou 500. 1001 e pronto. Em comum, estes livros têm duas obsessões: indicar mais de mil títulos para conhecer e abordar, subliminarmente, a morte. Ou seja, são sugestões para ler, ver, ouvir, tudo antes de morrer (falta citar os livros "1001 Viagens Antes de Morrer", "1001 Vinhos para Beber Antes de Morrer", entre outros títulos).
O que estes livros propõem é um conjunto de experiências culturais e de vida que extravasam o tempo útil médio de existência de qualquer mortal. Há qualquer coisa de exacerbado no princípio destes livros, e o excesso de sugestões pode revelar-se contraproducente e frustrante numa sociedade de informação massificada.
Na realidade, quantas vidas precisaríamos para conhecer todos os livros, os filmes, os discos, as comidas, as bebidas e os lugares propostos nesta espécie de enciclopédias temáticas?

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Uma geração perdida?

O sistema de ensino em Portugal afunda-se cada vez mais e, com ele, uma geração inteira. O facilitismo grassa, o nivelamento por baixo da exigência na aprendizagem idem, e há até quem diga (como um professor disse na revista Sábado de hoje) que a escola está toda baseada no erro: salas mal formatadas, turmas mal estruturadas, professores mal preparados, alunos desmotivados e conteúdos curriculares que não interessam nem ao menino Jesus. E o nível de competências da Língua Portuguesa e da Matemática afundam-se a olhos vistos para um pantanal cultural sem retorno. A sociedade deve reflectir, muito seriamente, que educação quer para os alunos de todos os níveis de ensino - do pré-escolar ao universitário. Não se trata apenas de uma questão de estatística de bom ou mau aproveitamento. É muito mais que isso: trata-se de hipotecar uma geração e o futuro do país. Apenas isso.
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Top 10 cinema italiano


O cinema italiano, à semelhança do francês, é um cinema que teve períodos de grande relevância histórica, cultural e estética na história do cinema mundial. São dois países cujas marcas de autor e de originalidade mais se fizeram sentir ao longo de décadas. Duas cinematografias muito criativas e pujantes.
Se em Itália emergiu o movimento Neo-Realista (Rossellini, Vittorio De Sica, Visconti) logo no pós-guerra, em França surgiu a não menos importante Nova Vaga na década de 60 (Godard, Truffaut, Rohmer, Rivette, Resnais...), que trouxe uma nova sensibilidade e uma nova forma de fazer cinema que marcaria para sempre a Sétima Arte.
Numa deambulação que fiz pela internet sobre cinema italiano, deparei-me com uma lista dos 10 melhores cineastas italianos de sempre. E é esta, por ordem decrescente:

10 - Robert Benigni
9 - Sergio Leone
8 - Pier Paolo Pasolini
7 - Franco Zeffirelli
6 - Roberto Rossellini
5 - Luchino Visconti
4 - Vittorio De Sica
3 - Bernardo Bertolucci
2 - Michelangelo Antonioni
1 - Federico Fellini
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As listas valem o que valem, mas custa-me a acreditar que Bertolucci seja considerado melhor realizador do que Visconti ou do que Vittorio De Sica. Assim como me causa certa estranheza ver o Zeffirelli à frente de Pasolini e do Sergio Leone. Ou nem sequer constar Nani Moretti.
Já os dois primeiros lugares - Fellini e Antonioni - são, quanto a mim, inquestionáveis.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Os Beijos



Alguém inventou hoje o Dia Mundial do Beijo.
E no cinema, que histórias tem o beijo para contar? Milhentas, certamente. O primeiro filme vencedor do Óscar de Melhor Filme (1927), "Wings" ("Asas"), foi o primeiro filme a mostrar dois homens a beijarem-se. Tratava-se de um beijo na face, entre dois grandes amigos, no momento em que um deles estava à morte, ferido numa batalha aérea. O beijo foi apresentado de forma fraternal, absolutamente não-sexual e não-erótica. Desde esse beijo fraternal entre dois homens, em 1927, até ao beijo homossexual explícito do filme "Brokeback Mountain", muita coisa se passou na genealogia do beijo no cinema.
O beijo sempre foi um elemento primordial nas histórias românticas. Expressão passional e amorosa por excelência, o beijo teve no cinema inúmeras formas de representação: mais ou menos eróticos, ternos, apaixonados, violentos, prolongados, súbitos, sedutores, contrariados, etc. E já agora lembremos a homenagem que o filme "Cinema Paradiso" (1988) de Tornatore, prestou aos beijos clássicos do cinema.
Um site elaborou a lista das dez melhores sequências de beijos no cinema (estranha-se o facto de não constar o célebre beijo na praia entre Burt Lancaster e Deborah Kerr no clássico "From Here to Eternity" (1953) de Fred Zinnemman):

1: Clark Gable e Vivien Leigh - "GONE WITH THE WIND"
2: Omar Sharif e Julie Christies - "DR ZHIVAGO"
3: Humphrey Bogart e Ingrid Bergman - "CASABLANCA"
4: Humprhrey Bogart e Audrey Hepburn - "SABRINA"
5: Rock Hudson e Doris Day - "PILLOW TALK"
6: Justin Henry e Molly Ringwald - "SIXTEEN CANDLES"
7: Elizabeth Taylor e Monty Clift - "A PLACE IN THE SUN"
8: Judd Nelson e Molly Ringwald - "THE BREAKFAST CLUB"
9: Gene Kelly e Debbie Reynolds - "SINGIN' IN THE RAIN"
10: Ethan Hawke e Winona Ryder - "REALITY BITES"

Nota: um link em que se pode visualizar algumas destas cenas de beijos.

Se ficaram muitas outras cenas de beijos de fora? Claro, muitas.
Entretanto, se estes são os dez beijos mais glamorosos e românticos do cinema, eu elejo o beijo mais macabro e arrepiante de sempre:
Jack Torrance a beijar uma mulher-cadáver em "The Shining" de Kubrick!

Discos que mudam uma vida - 102


The Waterboys - "This is The Sea" (1985)

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Kubrick fotógrafo


Antes de ser o realizador que todos conhecemos, Stanley Kubrick foi fotógrafo da revista nova-iorquina "Look". A paixão pela fotografia começara no dia do seu 13º aniversário, quando o pai lhe ofereceu uma valiosa máquina Leica.
Experiências atrás de experiências, Kubrick foi desvendando os segredos da fotografia, até que foi contratado com apenas 17 anos de idade pela "Look", dado o evidente talento revelado pelo então jovem em captar imagens de Nova Iorque do pós-2ª Guerra Mundial. Foi entre 1945 e 1950 que o fotógrafo Kubrick trabalhou para a revista.
Desses anos ficaram milhares de fotografias, umas foram publicadas pela revista, outras simplesmente ficaram no arquivo pessoal de Kubrick. Só em 1953 e após a frequência no curso de cinema é que Kubrick deixa a fotografia para se dedicar à arte pela qual ficou para a história, quando realizou a sua primeira longa-metragem, "Fear and Desire".
A partir da próxima sexta-feira até 4 de Julho, vai ser possível conhecer melhor a criatividade de Kubrick como fotógrafo. Mas só para quem se deslocar (ou estiver) em Milão, visto que é nessa cidade - no Palazzo della Ragione - que vão estar expostas cerca de 200 fotografias do jovem Kubrick. Como estras três: